domingo, 24 de julho de 2011

Os Simpsons

Dave, Heidi, Harry, Grace e Charli


Eles foram minha família aqui na Inglaterra. Mas uma família diferente, com a qual eu não convivia diariamente. Houve vezes em que passamos meses sem se falar. Nos encontramos relativamente poucas vezes neste meu período por essas bandas. No entanto, cada uma delas teve algo diferente, uma experiência única, coisas que eu nunca pensei que fosse fazer no meu tempo aqui e que não esquecerei jamais. Conviver com uma família, formada por adultos e crianças de faixas etárias diferentes da minha, de hábitos, crenças, conhecimento e pensamentos distintos, é algo que eu só posso recomendar para quem puder fazer. No fundo, são estranhos que viram seus amigos.

O primeiro encontro foi num jantar na casa dos Simpsons. Depois disso, nos encontramos outras vezes (mais até do que o programa do BISC - Bristol International Student Center - recomenda), em situações bem variadas. Este longo post, mais do que para vocês, serve para eu, no futuro, lembrar das coisas que fiz com eles por aqui.

- Fui ao aniversário de Dave, o pai da família, numa festa com os amigos dele em sua casa, num bairro afastado e tranquilo de Bristol. Entre os convidados, muitos eram seus vizinhos e companheiros da Igreja. Alguns deles trouxeram seus "alunos adotados" pelo mesmo programa do BISC que eu entrei. Tinha aluno de lugares como China e Nigéria. E das outras famílias, um cara me chamou a atenção, um senhor de bigode muito culto, que viajou o mundo todo (incluindo o Brasil) como engenheiro de represas, rendendo um ótimo papo. Jogamos um jogo de tabuleiro depois do jantar que consistia em perguntas e respostas, mimicas ou desenhos, mas muito, muito difícil para quem não era inglês ou tinha acabado de chegar, como era o meu caso em novembro. Eu e o nigeriano (que toda hora tentava roubar...) perdemos retumbantemente. Neste dia, infelizmente, não encontrei com as crianças.



- Íamos nos ver no Natal, mas minha única gripe aqui me acometeu exatamente no dia 22. Daí não quis arriscar de espalhar a peste nas crianças e decidi ficar em casa sozinho. Depois da virada, em janeiro, fui ao centro encontrar com eles. Sob um frio congelante de -5 graus, tomamos um chá por lá mesmo e, para minha surpresa, eles me deram presentes de Natal. Livros e guias da cidade de Bristol, coisa que você nunca pensa em comprar mas se arrepende depois que volta e não tem. Em seguida, fomos até a Biblioteca Municipal para fazer uma pesquisa sobre lobos que o Harry tinha que fazer para a escola. E como os pais sempre leem histórias para seus filhos antes de dormir, as meninas também puderam escolher um livro cada para levar para casa.

- O quarto encontro foi o mais inusitado de todos. Por circunstâncias diversas, não nos víamos havia mais de 4 meses, apesar nos mandarmos mensagem no meu celular frequentemente nesse ínterim. Envergonhado por não ter levado nenhum presente no Natal (mesmo tendo nos encontrado só em janeiro - talvez se fosse no Natal eu teria levado, mas depois que passou até esqueci disso...), resolvi comprar coisas para eles. Comprei um guia do Brasil e um saco de feijão para os pais, para o Harry (7 anos) comprei um Atlas e um joguinho de bandeiras (ele adora essas coisas, tanto quanto eu - quase comprei um para mim também... - e ficamos discutindo sobre países e mapas durante um longo tempo), para Charli, 4, um livro com 1000 atividades, desde coisas a colorir, desenhar, mexer com palavras, números etc., e para Grace, 2, um livro com letras de músicas infantis e um CD com as músicas (o velho MacDonald tinha uma fazenda...). Combinamos um almoço na casa deles, um churrasco na verdade (eles chamam aquilo de churrasco, enfim....), daí levei os presentes e, óbvio, adoraram. Em seguida, a mãe saiu com Harry para um evento (ao qual eu iria me juntar depois) e o pai pediu para eu cuidar das meninas enquanto cuidava das roupas. E lá estava eu, com duas crianças dispostas a brincar e que eu tinha que fazer um esforço sobre-humano para entender. Só sei que, passados 15 minutos, estávamos fazendo guerrinha de comidinha de plástico, as duas tacando as coisas na minha cabeça e eu caindo com os golpes (até que a maiorzinha resolveu tavar o boneco do chefe e este realmente doeu...) ou então elas montando em cima de mim para me imobilizar no chão. São brincadeiras que elas não fazem com os pais (eles não deixam...), mas que elas se divertiram muito fazendo comigo. E quando a menorzinha ameaçava chorar pela mãe, lá ia eu cair me oferecer de saco de boxe para entrete-la.... Criança é um barato!











- Passado o almoço, nos dirigimos para o segundo evento do dia, ao qual eu gentilmente me oferecera para ajudar: empurrar um sofá pelo bairro para arrecadar fundos para o café local. Lá estavam todas aquelas famílias que vi no aniversário de Dave, desta vez com todas as respectivas crianças. As crianças ficavam se revezando em cima do sofá enquanto os adultos empurravam a mobília. Até aí tudo bem, o sofá tinha rodinhas e tal. Mas, após 5 minutos, uma das rodas quebrou e a "empurração" ficou muito mais complexa. As mulheres prontamente desisitiram da tarefa, pois agora era necessário erguer a frente do maldito e pesado sofá. E o otário aqui era o mais jovem entre aqueles aptos para a tarefa. Eu e um outro cara nos revezamos no vértice do sofá com a rodinha quebrada, evitando assim uma hérnia e possibilitando o complemento da tarefa. Foi uma hora de caridade muito suada, principalmente nas subidas. E o pior é que eu nunca tinha ido naquele café e nem morava no bairro... Mas eu saí na capa do jornal semestral do bairro! Apesar que parece que eu não estou fazendo nada e a velha de costas que empurrou o sofá por 30 s parece estar fazendo todo o trabalho... Enfim, ao final da caminhada na Igreja, merecidamente, tomamos um típico Cream Tea, um bom chá com scone (um bolinho típico que se come com geleia e creme - ou gordura -, chamada popularmente de bomba calórica e que diminui a espectativa de vida da pessoa que a come em um mês). Terminado o dia, reconhecendo meu esforço, Dave e as crianças ainda me deram carona para casa e até entraram aqui, numa visita de menos de 1 minuto. Harry disse: "Nossa, como sua casa é pequena....". =D







- O nosso último encontro foi na semana passada. Almoçamos num restaurante chinês aqui perto (as meninas, agora totalmente apegadas a mim - diferente de Harry que se apegou a mim logo no primeiro dia - se divertiram com os noodles...), seguimos para o centro, onde andamos de ferry até o M Shed, o novo museu da cidade de Bristol, que conta a história da cidade, de suas personalidades, suas indústrias, seus bairros e suas curiosidades. Um museu muito bonito e bem construído, aproveitam as linhas de trem, os guindastes e os barcos para fazer demonstrações reais de como as coisas funcionavam no porto na época áurea da cidade. Até o barco do descobrimento da América pelos ingleses, dirigido por John Cabot, navegou por lá naquele dia.










Acontece que, quando se está com crianças, não se vê quase nada do museu! Tínhamos toda hora que cuidar delas, ver onde estavam e tal. Não havia tempo para ler as fichas ou nada do gênero. Mesmo assim, foi adorável. Harry se divertiu muito, pois eu fingia ser a criança e ele que tinha que cuidar de mim. Depois, fomos para um pub (para supresa dos ingleses que lá estavam ao ver crianças entrando), onde eles me entregaram uma caixa com presentes de despedida que eu só deveria abrir em casa (coisas típicas inglesas - uma delas a maldita Marmite -, uma bíblia anglicana e, principalmente, as cartinhas/desenhos/papéis cortados pelas crianças). Ainda seguimos, mais tarde, numa verdadeira caça ao tesouro num parque em Bristol, onde uma das Geocaches estava escondida. Após quase uma hora de procura, achamos a bendita. De acordo com as regras, deixei um tíquete bandejão e peguei uma gaita de plástico, que entreguei para Grace. E aí nos despedimos, Harry estava triste e meio sério pois sabia que eu não voltaria tão cedo, mas as meninas não me largavam. Agradeci demais aos pais, que também me agradeceram por tudo que passamos. Eles até me abraçaram! Para ingleses isto significa muito.













Três dias depois, no meu aniversário, eles me enviaram uma mensagem de parabéns e mais umas cartinhas pelo correio, junto com o jornal de Sea Mills do verão de 2011 para eu guardar. Eu reafimei que eles agora já tem um guia para quando vierem ao Brasil, serão mais que bem-vindos. Mas, mais que isso, é gostoso demais que você tenha feito uma diferença na vida de completos estranhos. Eu sei que, pelo menos para mim, eles fizeram uma baita diferença.

Cheers, família Simpsons!





quinta-feira, 21 de julho de 2011

Meu aniversário à moda inglesa

8h - Toca o bendito despertador.

8h30 - Tomando café, vejo o noticiário da manhã, incluindo a tentativa de torta na cara de Rupert Murdoch.

9h - Vou à Universidade, onde sou recebido por um insosso "Morning" pela alemã Nicole. Achei que ela tinha esquecido. Mas aí achei isso na minha mesa:



9h20 - Abro meu e-mail e vejo que o Azulão ganhou do melhor time do Gambolão e lidera invicto o Campeonato Brasileiro. Caixinha Lombardi.

10h30 - Depois de alguns Felizes Aniversários, incluindo mensagem da Família Simpson (lembram-se deles? Post em breve) meu amigo galês chega e me entrega este maravilhoso cartão:





12h30 - Vou para casa almoçar um Capeletti aos 4 Queijos com cheddar de queijo ralado. É meu aniversário, eu mereço...

17h30 - Após uma tarde com mais parabéns do que trabalho, parte do pessoal do laboratório vai comigo jogar tênis: Jim, Nicole, Doug, Ben, Mike e Okuda, o mito.

17h40 - Cai a maior chuva dos últimos 3 meses na cidade. E nós estamos no meio do caminho...

18h20 - A chuva cessa e nós chegamos ao Coombe Dingle Complex para uma tarde de animados jogos, incluindo uma memorável vitória deste que vos fala, sozinho, contra a dupla Ben e Okuda, o mito, por 21 a 4.







20h30 - De acordo com as tradições locais, aqui comemora-se aniversário em pub. E todos têm que pagar uma bebida para o aniversariante. Fazer o que, né? =D

21h - Meus pais me ligam no celular no momento em que um inglês vestido de banana adentra o pub.

23h30 - A animada conversa fica cada vez melhor conforme a noite cai e Janina, outra alemã, se junta ao bando. Enquanto isso, Okuda, o mito, quer comprar mulheres inglesas "low market" para mim, porque de acordo com ele esta é a tradição no Japão...






0h - Seguindo as tradições bristolnianas, sem jantar, o grupo se dirige a uma kombi em frente à Faculdade de Música da Universidade, nomeada Jason Donovan, e lá me compram uma porção de fritas com cheddar, o original. Uma delícia.

0h30 - Chego em casa e vou dormir, porque, infelizmente, não era sexta-feira.

9h - Convencido e decidido a fechar minhas férias desde o dia anterior, finalmente compro as passagens. Para onde vou?

Não, não vou contar...

domingo, 10 de julho de 2011

Game, set and match

Há duas semanas, num típico sábado de verão inglês completamente nublado, eu estava atrás de ver um bom tênis. E que lugar melhor para assistir a um bom tênis do que o mais antigo torneio de importância no tênis no mundo?

Wimbledon é tradição do começo ao fim. Em 2011 eles estavam comemorando a edição número 125 do torneio que começou em 1886. É isso aí: o Brasil ainda era uma monarquia quando os cidadãos começaram a bater uma bolinha na grama deste clube na periferia de Londres.

E se tem uma coisa que inglês gosta é tradição. Se há 125 anos os tenistas jogaram todos de branco, de branco eles devem jogar até hoje, sem exceções. Se a grama foi cortada a 8 mm em 1886, essa é a altura que eles a cortam nos dias de hoje. Até aí tudo bem, nada que afete os torcedores diretamente. Mas eis aí o X da questão. Se nos idos do século XIX as pessoas compravam os ingressos numa fila única, para que mudar o esquema no século XXI?

Pois é, uma fila enorme (e única) no dia dos jogos é o único meio de se comprar ingressos para Wimbledon caso você não seja famoso ou da família real. Os primeiros 500 na fila conseguem ingresso para a Quadra Central, onde os jogos mais importantes ocorrem. Os 500 seguintes conseguem para a Quadra 1, os 500 seguintes para a Quadra 2 e os demais até o ingresso número 7500 para as quadras 3-18. Se você quiser entrar numa das quadras principais, tem que acampar na fila. Eu vi pessoas acampando às 10h da manhã de sábado para ver os jogos na segunda-feira. Tem que ser muito louco ou não ter nada melhor para fazer da vida...

Enfim, a fila é gigante. E, que surpresa, muito organizada. Não tem ninguém furando fila, nenhum cambista, banheiros químicos absolutamente limpos etc. etc. etc. Dá até para aproveitar o tempo. Bom, nas primeiras duas horas. Depois disso fica um saco. Ainda mais quando você tem que esperar 6 (SEIS) horas para entrar.

Eu cheguei às 6h10 da manhã do sábado, depois de pernoitar na casa da Aline. Só que eu tinha que esperar meu amigo Ben e seus colegas chegarem (é contra o Código da Fila guardar lugar). Eles chegaram às 6h40. Nisso eu perdi mais de 1000 posições na fila. Quando se chega na fila você recebe um Qeue Card, um cartão com um número. O meu era número 5036. Se você tem o Qeue Card número 7501 você tem que esperar uma das 7500 pessoas da sua frente se cansar e deixar Wimbledon, daí eles revendem o ingresso e você entra. Mas a fila dessa revenda é tão maçante quanto a outra... Voltando ao meu caso, na hora eles me prometeram que duraria menos de 4 horas. E na quarta hora eu já estava de saco na lua. Não é fácil ficar com 4 ingleses (3 dos quais você não conhece) com aquele sotaque carregado, com aquele humor típico deles, conversando com 5-6 outros ingleses atrás na fila, e cheios de assuntos internos dos quais eu não tenho a menor ideia do que se tratam. As últimas horas foram um pé no saco! Quase que eu puxei conversa com o japonês na minha frente para escapar da overdose bretã.

Logo que eu entrei uma das meninas que estava comigo começou a correr para chegar até a quadra 12, porque segundo ela lá aconteceriam os melhores jogos dentre as quadras 3-18. Isso significou que não pude nem olhar direito Wimbledon quando lá entrei, não pude nem assentar as ideias, tirar umas fotos e tal, fui direto para a tal quadra 12. Sentei lá, vi um game do jogo da mulher número 4 do mundo e decidi sair para explorar sozinho. Meu amigo (e namorado da menina) decidiu vir comigo. Eu não estava lá para ver um jogo específico ou um jogador em especial, eu estava lá para curtir, ver como funciona Wimbledon. E foi exatamente isso que eu fiz.

Não assisti a um jogo inteiro sequer. Fiquei zanzando de uma quadra pra outra. Vi jogo de simples, de duplas, de duplas mistas, de homem, de mulher (algumas formosas e outras nem tanto), de meninos, de meninas, de sêniors etc. Foi absolutamente sensacional. O nível é muito alto, mesmo não vendo Federer, Nadal, Djokovic ou afins. São jogadores top 10 do mundo jogando no mais tradicional torneio do mundo. Teve cada jogada sensacional, e tudo numa velocidade fantástica (coitado dos juízes de linha). Vi jogador se desesperando, ouvi a Sharapova gritando (de outra quadra!), vi gigante jogando com "anão", vi gente famosa (Boris Becker, o loiro de terno numa das fotos abaixo). Tem quadra que eu sentei pertinho, tem outras que fiquei de pé no alto, teve hora que sentei no morro para ver o telão passando o jogo que estava acontecendo na quadra central.

Foram seis horas muito divertidas. O duro é que para chegar lá você tem que passar por uma fila massiva. É aquela coisa para fazer uma vez na vida e dizer que fez, que esteve lá. E eu fiz, estive lá.




























PS: ficamos tão empolgados com o tênis que o pessoal do lab decidiu ir jogar tênis na semana passada (na quadra dura, não na grama...). Foi muito divertido, jogamos por 3 horas, incluindo sob chuva. Mas quando o Ben resolvia sacar sério nenhum de nós chegava perto da bola...