
Cá estou eu de volta para o blog depois do Congresso e da viagem. Mas decidi não falar de nenhum dos dois agora. Decidi falar sobre um tema que voltou à tona nesses últimos dias: o racismo.
Pesado né? Mas eu não pretendo fazer um texto assim não, é mais para contar a minha visão sobre o tema. Primeiro, não vou me restringir só ao racismo em relação aos negros, mas racismo em relação a estrangeiros como um todo. Segundo, tudo que colocarei aqui é apenas minha opinião pessoal, vc pode discordar ou concordar ao seu bel prazer.
No último domingo fui a Londres assistir ao jogo Brasil x Escócia, no estádio do Arsenal, o Emirates Stadium. O jogo foi divertido, ver a seleção de novo foi bem emocionante, e, ainda, o Ronaldo Fenômeno receber uma homenagem. Fui com a Aline, o noivo alemão dela e um amigo brasileiro dele.
Qual não foi a minha surpresa ao chegar em casa e ver todo o burburinho em torno de racismo. Uma banana foi atirada no gramado durante o pênalti do segundo gol. Os escoceses vaiavam fortemente toda vez que o Neymar pegava na bola. Os brasileiros saíram acusando a torcida escocesa de racismo, basta ver as entrevistas depois do jogo. Muitos jornalistas entraram na onda do 'é lamentável', 'primeiro mundo o quê?' etc. Os escoceses negaram racismo.
A visão de quem estava no estádio: o Neymar foi sim vaiado. Primeiro, porque 70% do estádio era ocupado por escoceses. Segundo, ele foi vaiado pelo seu estilo de jogo. O cara é cai-cai, se joga, simula faltas, dribla pra trás etc. Todo mundo sabe disso no Brasil. Mas aqui na Europa esse tipo de jogo irrita muito. No primeiro tempo o Neymar caiu, se atirou no chão e começou a se contorcer de dor numa jogada. Foi retirado pela maca, só para, imediatamente após sair de campo, se levantar milagrosamente curado e voltar pro jogo. No Brasil isso é comum, aqui não. E isso irritou ainda mais os escoceses. As vaias não têm absolutamente NADA a ver com racismo.
E olha que eu estou defendendo os escoceses, e não tenho nenhum motivo especial para tal. Durante os metrôs para o estádio e durante o jogo todo ouvimos eles gritando a favor do Maradona, de que os brasileiros sempre simulam faltas nos jogos de futebol etc. etc. etc. Tudo normal, contudo, provocações sadias sem conteúdo racista nenhum, fomos super respeitados em todos esses ambientes teoricamente hostis (diferentemente do que acontece numa mesma cidade com torcedores de times diferentes no Brasil). E os brasileiros também provocavam de volta, inclusive o tal do amigo do noivo da Aline que estava com a gente (que figura lamentável, me relembra como alguns brasileiros podem ser nojentos), principalmente com relação às gaitas de fole, à aparência ogra e aos kilts, estas brilhantes saias que eles usam (muitos sem cueca por baixo, como muitos fizeram questão de mostrar):
Voltemos às bananas. Eis que a banana é atirada no gramado. Ato racista? Lógico. Ato isolado, porém. Isso não representa a torcida da Escócia nem o povo escocês, ainda mais porque descobriram depois que quem jogou a banana foi um adolescente alemão que estava no meio da torcida do Brasil. Porém, isso tampouco representa o povo alemão, mas sim um otário alemão que devia estar se achando o gostosão para impressionar os amigos. Acho muito fácil apontar o dedo e acusar os outros de racismo como fizeram muitos brasieliros, pois é um tema muito delicado em que todos tendem a apoiar o acusador. Difícil agora é virem se retratar pelas reportagens ou comentários feitos no calor do jogo.
Preconceito existe em qualquer lugar do mundo. Na Escócia, na Alemanha, na Inglaterra, no Brasil. Pode ser que aqui tenha mais, sim, pode, mas é uma minoria tão grande que não vale à pena ser destacada. A maioria das pessoas tolera diferenças aqui (veja bem, tolerar não significa aceitar, isso é outra coisa...), basta ver o tanto de gente diferentes cores, religiões, sexos, nacionalidades, idades, cores de cabelo, números de tatuagens ou piercings, circulando todo dia por Londres. Óbvio que vc sente de vez em quando uma certa repúdia por ser estrangeiro, principalmente nas filas de passaporte dos aeroportos onde os funcionários tem sempre uma leve soberba ao falar com vc (e isso pq não sou árabe ou muçulmano...), mas são raras as situações em que isso ocorre no dia-a-dia. No entanto, os extremistas continuam por aí em todos os lugares. Eu tenho um exemplo bem próximo de mim, exatamente dois metros de distância do meu computador na Univerisdade.
Já falei sobre ele outras vezes, mas bem rapidamente. Simplesmente eu o classifico como a pior pessoa com quem eu já convivi. Ele é grosso, estúpido, racista, vagabundo etc. Não faz questão nenhuma de ser diferente. Já o vi falando e fazendo coisas horríveis. Mas o pessoal aqui o respeita, pois é o mais velho do lab, é inteligente e bem humorado, o pessoal se sente bem sendo amigo dele. Eu nunca falei por mais de 10 segundos com ele. Nunca me deu um bom dia, nem eu a ele depois que ele me negou um 2 vezes. Se bobear ele nem sabe meu nome. Eu o chamo carinhosamente de hooligan. E ele odeia estrangeiros, publicamente, pra ele é só inglês que presta (se bobear só bristolnianos). Imagina só se eu generalizasse o comportamento dele para o comportamento dos ingleses como um todo? Ou pior, dos europeus? É esse raciocínio simplista que eu odeio ver nas declarações dos jogadores e em alguns dos jornais. Imagina se os escoceses entendessem o que o amigo do noivo da Aline falava deles no estádio e generalizassem para os brasileiros como um todo?
Mas eis que, antes de eu ir assistir ao jogo da NBA, eu era o escolhido do lab para cozinhar alguma coisa para o povo do lab comer (tradição às sextas-feiras). Resolvi acabar com meu estoque e fazer pão de queijo, coisa bem brasileira. Levei queijo cremoso e doce de leite (trazidos pelos meus coleguinhas em sua visita à minha casa em janeiro). Óbvio que todo mundo pirou, delicioso, além de ser bem típico.
Eis que o hooligan entra, atrasado, olha os pães de queijo, pergunta para seu amiguinho inglês que raios é aquilo, faz uma careta de nojo, decide tentar provar e... solta um hmmmmm e pergunta: quem fez? O amigo dele disse, foi o André. Ele olha para mim (vejam, ele sabe meu nome), abre um sorriso (!!!!) e diz: Very nice, very nice.
Carinhosamente apelidei esse dia como aquele em que o pão de queijo dobrou um hooligan.